tela: Kandinsky |
Autoras:
Irene
Gaeta Arcuri
Marília
Ancona-Lopez
“Temos arte para que a realidade não
nos mate” (Nietzsche)
A
Arteterapia é um novo campo do conhecimento, um campo de interfaces,
interdisciplinar por natureza. Ao se constituir como um novo campo do saber, a
Arteterapia se depara com a interlocução entre várias áreas do conhecimento:
antropologia, arte, psicologia, neurologia, psiquiatria, filosofia, sociologia,
etc, enfim, fazendo várias interlocuções, sem que seja possível que não seja
assim.
Inter
é
sufixo latino que significa “entre”, “no meio de”. O termo “interface” carrega
em si a idéia de que há uma superfície de contato, de articulação entre espaços
de realidades diferentes, que pode ser mais ou menos amplo e que varia de
momento para momento, ou seja, nunca é estanque. E para que dois elementos
funcionem em conjunto é necessária uma conexão, ou várias. Desta maneira
podemos pensar que se trata de uma área do conhecimento interdisciplinar por
excelência, a qual não pretende a unidade de conhecimentos, mas a parceria e a
mediação dos conhecimentos parcelares na criação de saberes.
Trata-se
de um exercício que requer responsabilidade pelo pensamento, pelas idéias,
pelas ações e pelos sentimentos, viabilizando o conhecimento por meio de
competências multifacetadas, incluindo uma racionalidade aberta e acolhedora,
pois a emergência das emoções e também da intuição deve necessariamente estar
incluída no processo como um todo. Certamente, não se trata de uma proposta
simples, já que, neste sentido, a Arteterapia não apresenta um escopo de
conhecimento básico exclusivamente seu, como seria o caso da biologia, por exemplo,
ou da psicopatologia, entrando então estas em contato com outras disciplinas; o
que ocorre, a meu ver, é o surgimento de um novo saber a partir de múltiplos
outros saberes, o que suscitaria porventura o termo “transdisciplinaridade”
como o mais correto para designar o caminho que se descortina à nossa frente.
A perspectiva
transdisciplinar requer a eficácia de uma dialógica, abertura para escutar o
que se passa em outras esferas do conhecimento, mesmo mantendo posição
divergente, pois é impossível saber tudo e, diferentemente da ciência
cartesiana, na Arteterapia, conhecimentos divergentes não são necessariamente
excludentes. A transdisciplinaridade aparece como um movimento de
reconhecimento do espírito e da consciência, uma consciência nova de realidade
e, a bem da verdade, uma nova realidade. È uma conciliação que resulta da
compreensão e do re-equilíbrio entre o saber produzido e as necessidades
interiores do Homem. Portanto, a transdisciplinaridade instala-se na interação
entre o sujeito e o objeto, na compreensão de que a realidade é
multidimensional, ou parafraseando Jung (1964, p.23), diante do infinitamente
grande e do infinitamente pequeno: “não importa até onde o Homem estenda os
seus sentidos, sempre haverá um limite à sua percepção consciente”, e a
Arteterapia busca, no próprio cerne do seu nascimento, do seu desenvolvimento e
da sua proposta, transcender este limite. Fazendo uso da arte como ferramenta
de trabalho, a Arteterapia exalta e liberta as qualidades do indivíduo na
práxis da vida, ajudando-o a sentir-se, pensar-se e a agir de acordo consigo
mesmo, criando um canal de comunicação entre seus conteúdos conscientes e seus
conteúdos inconscientes, ao longo de sua existência. Trabalhando a
criatividade, dando forma, cor, expressão aos sentimentos inonimados, conexões
são feitas e novos significados podem ser atribuídos a velhas situações vividas
que não puderam ter livre canal de expressão no momento em que ocorreram. A
arte devolve a liberdade à alma aprisionada pelo vazio, pelo medo, ou ainda
pelos sentimentos não nomeados (Arcuri, 2004), e leva à concretização dos
anseios das necessidades interiores do ser humano.
Arteterapia pode ser considerada como a utilização de
recursos artísticos em contextos terapêuticos, baseando-se na percepção de que
o processo criativo envolvido na atividade artística é terapêutico e
enriquecedor da qualidade de vida das pessoas. Age a serviço das leis da
necessidade interior do Homem e facilita o entrar em contato com o poder
criador de cada um, permitindo transpor para o exterior o que ocorre – via de
regra, de maneira caótica – no interior, levando assim o paciente a poder
observar, refletir, interagir, dialogar e elaborar. Proporciona o
reconhecimento da dinâmica psíquica que é uma via de acesso à totalidade de
ser. O arteterapeuta amplia e desdobra o potencial do processo de criação do
ser humano, como que num processo alquímico, ou como diria são Tomáz de Aquino citando
Avicenna em seu Tratado da Pedra Filosofal: “tudo aquilo que existe em
potência pode ser reduzido em ato”.
As percursoras da Arteterapia foram Margaret Naumburg, em
1941, e Edith Kramer, em 1958. Naumburg foi responsável por sistematizar a
Arteterapia. Começou a desenvolver sua teoria a partir do âmbito educacional e
fez algumas relações com trabalhos realizados de forma espontânea. Suas
técnicas de Arteterapia eram baseadas na pressuposição de que todo individuo
pode projetar seus conflitos em formas visuais. Com abordagem psicanalítica,
fazia uso da associação livre no trabalho de arte espontâneo, o qual era
compreendido como uma projeção do inconsciente.
Posteriormente Janie Rhyne em 1973, e Natalie Rogers, em
1974, contribuíram de forma significativa para a história da Arteterapia
explicando como o processo criativo acontece. Rhyne uniu a teoria gestáltica ao
trabalho com arte. O foco do seu trabalho foi a experiência vivida no presente,
na teoria do contato, na sensibilização e no conceito praticamente intraduzível
de awareness. Na experiência gestáltica de arte, o processo criativo
acontece na medida em que as pessoas expressam suas emoções, confiando e usando
suas percepções sensoriais. A Arteterapia surge então como uma profissão e, em
1969, foi fundada a American Art Therapy Association.
No Brasil, em 1925, Osório César começou a utilizar a
Arteterapia no Juqueri e, posteriormente, a psiquiatra Nise da Silveira, em
1946, começou a desenvolver também um trabalho arteterapeutico no Rio de
Janeiro, particularmente no atendimento de esquizofrênicos, criando mais tarde
o Museu do Inconsciente.
Atualmente temos vários cursos de Arteterapia distribuídos por
todo o país; os mesmos têm crescido de forma rápida, e podemos dizer que a
emergência e a consolidação do ensino e da pesquisa em Arteterapia no âmbito da
Universidade e fora dela é um significativo evento científico dos últimos dez
anos no Brasil. Este crescimento tão rápido parece ocorrer para atender as
demandas do ser humano que, na atualidade, podem estar entorpecidos pela
tecnologia e pelas doutrinas materialistas com suas tendências meramente
utilitárias. A Arteterapia pode prover a alma de sua necessidade de libertação.
A expressão artística, muitas vezes, exprime indivisíveis emoções, levando à
concretização dos anseios e das necessidades do ser humano. Emoções que não
encontram uma maneira socialmente aceitam de expressão, que se introvertem, criando
fendas nas profundidades do psiquismo, e deformando suas estruturas básicas.
Certamente a linguagem abstrata presta-se a dar forma a
segredos pessoais, satisfazendo uma necessidade de expressão sem que os outros
os devassem. A linguagem abstrata cria-se a si própria a cada instante, ao
impulso das forças em movimento no inconsciente. (SILVEIRA,1981, p.19)
O que garante o Homem sadio contra o delírio, a depressão e o
sofrimento psíquico de ordens diversas não é a sua crítica, mas a estruturação
do seu espaço. O sofrimento, muitas vezes, é oriundo do estreitamento do espaço
vivido, do enraizamento das coisas no nosso corpo, da vertiginosa proximidade
do objeto. Nos sintomas neuróticos, as experiências da espacialidade são
essencialmente determinadas pelo tom afetivo dominante no momento. O espaço
adquire qualidades peculiares de acordo com o estado emocional do individuo:
sensação de plenitude ou de vazio, de espaço amplo ou opressor, iluminado ou
sombrio.
A expressão artística, muitas vezes, exprime indivisíveis
emoções, levando à concretização dos anseios e das necessidades do ser humano.
Emoções que não encontram uma maneira socialmente aceitam de expressão, que se
introvertem, criando fendas nas profundidades do psiquismo, e deformando suas
estruturas básicas.
Minkowski (1968) aponta que vivemos em dois mundos, ou seja,
dois sistemas de percepção totalmente diferentes: percepção de coisas externas,
por meio dos sentidos, e percepção de coisas internas, por meio das imagens do
inconsciente. A expressão plástica pode tornar real esse fenômeno psicológico
por meio das imagens realizadas no ateliê terapêutico, permitindo que a
nebulosidade de sentimentos e pensamentos ou a clareza de afetividade se torne
visível. Se os conteúdos internos entram em intensa atividade, sua forte carga
energética subverte a ordem espacial estruturada pelo consciente. Nesse
sentido, podemos concluir que toda obra de arte pode ser considerada um documento
psíquico, e é pela expressão artística que podemos entender as relações do
individuo com o meio em que vive e também a idéia que ele tem da ordem cósmica.
Silveira (1981) alerta para o fato de que o espaço imaginário
e o espaço da realidade estão estreitamente interligados. A reconstrução do
espaço cotidiano acompanha a reconstrução do ego. Como o corpo tem necessidade
de trabalho, de um fortalecimento muscular, a alma também necessita ser
fortalecida. O trabalho por meio da arte proporciona o reconhecimento da
dinâmica psíquica, tornando-se uma via de acesso à totalidade do ser,
fortalecendo a alma.
Tem-se substituído a alma pela palavra psique. Mas será que a
psique substitui a alma? Jung (1985) nos fala que “realmente é impossível
fazer o tratamento da alma e da personalidade humana isolando umas partes do
resto”(pg.91). Desta forma, podemos pensar que a Arteterapia pode
possibilitar a ampliação da consciência, pois, ao promover o reconhecimento da
dinâmica psíquica, um diálogo com os conteúdos inconscientes pode ocorrer e os
mesmos podem ser trazidos à consciência. Esta ampliação da consciência permite
que as projeções sejam recolhidas do mundo exterior e integradas. Não é o
sujeito que se projeta, mas o inconsciente. Por isto não se cria a projeção,
ela já existe de antemão. A conseqüência deste processo é o isolamento do
sujeito em relação ao mundo exterior, pois, em vez de uma relação real, o que
existe é uma ilusão. As projeções levam a um estado de ensinamento, no qual se
sonha com um mundo cuja realidade é inatingível. Quanto mais projeções se
interpõem entre o sujeito e o mundo exterior, tanto mais difícil se torna para
o Eu perceber suas ilusões.
Entendemos por Eu aquele fator complexo com o qual todos os
conteúdos conscientes se relacionam, diferenciando-o do Self, no qual também os
conteúdos inconscientes se relacionam. Este fator se constitui como o centro do
campo da consciência e é o sujeito de todos os atos conscientes da pessoa. O Eu
considerado como conteúdo consciente em si, não é um fator simples, elementar,
mas extremamente complexo, sendo impossível, portanto, descrevê-lo com
exatidão. O Eu possui livre-arbítrio, embora apenas dentro dos limites do campo
da consciência, possibilitando, entretanto, um sentimento subjetivo de
liberdade. O Eu é o sujeito de todos os esforços de adaptação do ser humano.
Mediados
pela Arte, estes fenômenos da ampliação da consciência podem ser expressos de
forma a adequar significados na vida da pessoa. Ou seja, a arte surge como
potencialização, um recurso que propicia olhar a experiência vivida,
atribuindo-lhe um sentido singular. A experiência arteterapêutica pode acolher
e dar forma e significado ao que antes se apresentava como um desconforto. Para
Delefosse: “...a consideração da interação que auxilia a explicitação do
vivido, trata-se, portanto de um trabalho interativo que visa, de um lado,
favorecer a atividade de construção do sentido do mundo vivido através de uma
situação dialógica reflexiva e de outro lado, produzir conhecimentos
psicológicos a partir deste material” (p.150.
Ainda segundo Delefosse: “compreender
nas ciências do Homem é rejeitar a busca de formulas e leis universais, pelo
menos enquanto objetivo principal, e buscar colher a partir do interior a
subjetividade significante. A retomada da criatividade possibilita
transformações e atribuições de novos significados às experiências vividas,
frustradas, ou simplesmente sonhadas. Desta forma as experiências dolorosas e
suas cicatrizes podem ser integradas numa consciência ampliada.
Grof (2000) sugere que no estado de consciência cotidiana
identificamo-nos com apenas uma fração de quem realmente somos. Nos estados que
chamou de holotrópicos, o que significa “caminhar em direção à totalidade do
próprio ser”, podemos transcender as fronteiras restritas no ego corporal e
reivindicar uma identidade total. Nos estados holotrópicos, ocorre uma mudança
qualitativa de consciência de forma profunda e fundamental. Desenvolver um
estado holotrópico de consciência leva o indivíduo a mudanças de percepção em
todas as áreas sensoriais. No entanto, a consciência quando se amplia tem
acesso a informações antes inconscientes, e libera um quantum de energia
emocional que estava ligada a processos traumáticos do passado, e então retorna
ao estado de vigília anterior, embora acrescida destas experiências e de seus
conteúdos. Segundo Grof (2000): “Um aspecto particularmente interessante dos
estados holotrópicos é seu efeito sobre os processos de pensamento. O intelecto
não fica debilitado, mas opera de uma forma significativamente diferente do seu
modo de funcionamento diário. Esse tipo de experiências holotrópicas é a
principal fonte de cosmologias, mitologias, filosofias e sistemas religiosos
que descrevem a natureza espiritual do cosmo e da existência. Elas são as
chaves para a compreensão da vida ritual e espiritual da humanidade, desde o
xamanismo e as cerimônias sagradas das tribos aborígenes, até as grandes
religiões do mundo” (p.19).
Cézanne, pintor francês, tratava os objetos como homens e
descobria a vida interior em tudo. Até mesmo uma taça transformava-se em um ser
dotado de alma. A arte pode ser uma força capaz de levar o homem além do
“vazio”. É uma linguagem capaz de estabelecer uma conexão com a psique e é a
única capaz de compreendê-la. A arte devolve a liberdade à alma aprisionada
pelo vazio, pelo medo ou ainda pelos sentimentos que não têm nome. E ela leva à
concretização dos anseios da necessidade interior do ser humano.
Rollo May (1995) define criatividade como um processo
altamente emotivo que decorre da experiência da auto-realização da nossa
potencialidade com um intenso encontro com uma idéia. Kandínsky (1985), ao
analisar as diferenças culturais, aponta que o silêncio é sentido como morte
para os chineses cristãos enquanto os chineses não cristãos consideram o
silêncio como a primeira fase em direção a uma linguagem nova. Depois de buscar
esse silêncio interior atingimos o ponto zero, que possibilita a entrada na
criação do novo. Este “novo” pode ser expresso pela modelagem em argila. A
argila rompe a inércia, enaltecendo o princípio feminino da criação, gestando
vida, possibilitando a vivencia simultânea dos quatro elementos da natureza:
ar, água, fogo, terra. Gouveia (1989) descreve: “...quando em certos pedaços
de barro, ele consegue achar sombras vivas que se movem e tudo o mais que for
necessário para simbolizar os seus medos profundos, o cotidiano de sua vida em
comum com os restos dos mortais, quando encontra a criança escondida na
angustia da adolescência e da idade adulta ... e modela o que capta para além
da aparência” (p.56).
Em relação ao vazio existencial, o medo profundo sinaliza uma
dependência psicológica. Esta carência, a sensação de falta que se dá em todo
ser humano, pode encontrar na Arteterapia, com a expansão da consciência, uma
modificação de sentimentos, de visões e atitudes frente ao mundo,
possibilitando uma transformação eficiente, uma transição menos dolorosa para
um estado de inteireza do ser, porque o mesmo encontra um canal de expressão
que pode conter o sofrimento. Kandisky (1985) afirma: “...como qualquer ser
vivo é dotado de poderes ativos, e a sua força criadora não se esgota, vive,
age e participa na criação de uma atmosfera espiritual” (p.113). A arte é,
portanto é uma linguagem capaz de criar um canal de comunicação com a psique, é
capaz de compreendê-la na sutileza dos seus nuances.
Ao considerar a dimensão espiritual da psique humana
encaminhamos a nossa discussão para a questão da Psicologia que estuda
atualmente o fenômeno da ampliação da consciência, muito presente nos processos
arteterapêuticos. Os precursores da Psicologia Transpessoal concentraram-se no
estudo da consciência e pesquisaram os fenômenos e as experiências “não
ordinárias” de consciência. Dentro da perspectiva transpessoal a consciência
comum é considerada como um estado contraído e defensivo. Neste sentido, nossa
consciência opera inundada por um fluxo contínuo de pensamentos e fantasias que
acorrem para atender as demandas de nossas defesas cotidianas. Dentro desta
visão, a ampliação da consciência se daria por meio do abandono dessa contração
defensiva e da remoção dos obstáculos ao reconhecimento do potencial de
encontro com os mundos interno e externo, sempre presente no apaziguamento da
mente e na redução da distorção perceptiva.
Diferentemente
da concepção ocidental que considera apenas uma gama limitada de estados de
consciência, fundamentalmente o estado onírico e o estado desperto, a
Psicologia Transpessoal considera que há um amplo espectro de estados de
consciência. Grof (1987) sugere que, no estado de consciência cotidiana
identificamo-nos com apenas uma fração de quem realmente somos. Nos estados que
chamou de holotrópicos podemos transcender as fronteiras restritas no Ego
corporal e reivindicar uma identidade total. Nos estados holotrópicos de
consciência, ocorre uma mudança qualitativa de consciência, profunda e
fundamental. Desenvolver um estado holotrópico de consciência leva o indivíduo
a mudanças de percepção em todas as áreas sensoriais. Assim, explica Grof: “Um
aspecto particularmente interessante dos estados holotrópicos é seu efeito
sobre os processos de pensamento. O intelecto não fica debilitado, mas opera de
uma forma significativamente diferente do seu modo de funcionamento diário.
Esse tipo de experiência holotrópica é a principal fonte de cosmologias,
mitologias, e sistemas religiosos que descrevem a natureza espiritual do cosmo
e da existência. Elas são as chaves para compreensão da vida ritual e
espiritual da humanidade, desde o xamanismo e as cerimônias sagradas das tribos
aborígines, até as grandes religiões do mundo” (2000 p. 19). Ao longo de
nossa existência, em momentos de crise podemos re-desenvolver, romper ou
ampliar as fronteiras do “Eu”. Isto significa que, a todo o momento,
reconstruímos ou destruímos nossa identidade.
Uma das metas da terapia transpessoal
seria a tentativa de rompimento com o estado de estagnação da consciência nas
porções da personalidade que impedem que outras esferas do ser se manifestem,
e, por meio deste rompimento, permitir que a personalidade integral exerça cada
vez mais efeito nas atividades cotidianas do indivíduo. O resultado bem
sucedido da terapia transpessoal pode ser descrito então como um senso ampliado
de identidade, em que o Eu é visto como o contexto da experiência de vida,
considerada como conteúdo, sem um grau de restrição tão dramático, como o que
ocorre na experiência usual dominada pelo ego.
O conteúdo transpessoal inclui quaisquer
experiências em que a pessoa transcenda as limitações da identificação
exclusiva com o ego ou com a personalidade, o que termina por se constituir
então num objetivo fundamentalmente similar ao da Arteterapia. Também inclui os
domínios míticos arquetípicos e simbólicos da experiência interior, que podem
vir à consciência por meio de imagens e de sonhos.
As experiências transpessoais têm uma
posição especial na cartografia da psique humana. Os níveis
rememorativo-analítico e o inconsciente individual são de natureza claramente
biográfica. A dinâmica perinatal parece representar uma intersecção ou
fronteira entre o pessoal e o transpessoal. Isto se reflete em sua profunda
associação com o nascimento e a morte – o início e o fim da existência humana
individual, fenômenos que, no momento, estão além de nossa compreensão. (Grof,
1997). Porém, tudo que podemos dizer é que no processo de desdobramento
perinatal parece ocorrer um estranho retorno qualitativo e, por meio dele, a
auto-exploração profunda e o inconsciente individual tornam-se um processo de
aventuras e experiências no universo, que envolvem o que pode ser melhor
descrito como consciência cósmica ou mente superconsciente.
Os sintomas emergentes refletem o
esforço do organismo para livrar-se dos antigos estresses e das marcas
traumáticas, e simplificar seu funcionamento. Este desenvolvimento é, ao mesmo
tempo, um processo de descoberta da própria e verdadeira identidade e também
das dimensões do próprio ser, que converte o individualismo com todo o cosmos e
que são proporcionais a toda existência.
Trabalho do I
Simpósio Internacional de Pesquisa em Psicoterapia – agosto 2006
Disponível
em: http://www.puc-campinas.edu.br/rep/pos/arquivos/I_SIPP_Trabalhos-Resumos.pdf pp.10-18 . Acesso dia 01 de agosto de 2011.
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